Dra. Heloisa Helena Arantes Gallo da Rocha
Dra. Elise G. Maia
* Médica hematologista do Serviço de Hemoterapia do Hospital dos
Servidores do Estado do Rio de Janeiro
** Bióloga do Laboratório Diagnóstico da América.
Abstract:
Background- Von Willebrand disease is the most
prevalent between all coagulopathies. The prevalence of this disease was not
known here in
Methods: 106 patients had their blood collected
in Lamina Laboratory from
Results: The analyses disclosed a 9,5%
prevalence of von Willebrand disease within the female group (62 patients) and
a 4,5% prevalence in the male group (44
patients) .7 patients had elevated levels of von Willebrand factor. Those
patients had cancer (3 patients), uremia (1 patient); children without a
known disease (2) .1 case we did not
find the file.
Conclusions: Put all these together we can conclude
that he prevalence of von Willebrand disease is high in our country. The
prevalence was higher in women because they have menses and so a greater
opportunity to demonstrate a bleed disorder. The von Willebrand factor nowadays
is considered to be an important cause of microangiophatic thrombosis and an
important clue to aterothrombotic events.
Key words: von Willebrand disease; von
Willebrand factor; prevalence; microangiopathy.
Resumo:
As autoras fazem um estudo da prevalência da doença de von Willebrand dentro de um grupo de 106 pacientes que
tiveram seu sangue coletado no Laboratório Lâmina entre março de 1999 e março
de 2000 afim de diagnóstico diferencial de coagulopatia. Fazem também uma
revisão da Literatura Médica sobre a doença e o fator von Willebrand.
Resultados: O estudo demonstrou uma prevalência de 9,5% entre as mulheres (62 pacientes) e uma
prevalência de 4,5% entre os homens (44 pacientes). 7 pacientes tinham níveis
elevados de fator von Willebrand. Estes pacientes apresentavam câncer (3
pacientes), uremia (1 paciente) , 1 não se conseguiu encontrar a ficha e 2
crianças aparentemente normais.
Conclusões: O número aumentado
de mulheres com doença de von
Willebrand, relacionado aos homens se deve provavelmente ao fato das mulheres
menstruarem e assim maior chance de demonstrar coagulopatias. O fator von
Willebrand de cerca de uma década para cá tem se mostrado importante em situações de tromboses microangiopáticas e de ativação plaquetária no processo de átero- trombose. Devido ao fato de muitos planos de saúde não cobrirem a
realização da dosagem do fator von Willebrand e os altos custos do mesmo
nos Laboratórios, torna-se difícil para
os médicos hematologistas fazerem o diagnóstico da doença e para
os oncologistas, nefrologistas, infectologistas, intensivistas e
pediatras conhecerem os níveis do fator von Willebrand em casos de neoplasias
metastáticas, uremia, HIV, uso de clopidogrel ou de ticlopidina e púrpura
trombocitopênica trombótica Assim sendo
torna-se necessário conscientizar a medicina de grupo e os Laboratórios
quanto à importância da realização do referido exame para diagnóstico e
controle de várias doenças.
Palavras chave: doença de von Willebrand; fator von Willebrand; átero
tromboses e microangiopatias trombóticas.
Introdução:
A Doença de von Willebrand (DvW) é a coagulopatia mais
freqüentemente encontrada na
prática médica. Sua prevalência varia de
0,1% a 1% da população geral( 19 ). Está correlacionada com uma alteração
qualitativa ou quantitativa no Fator von Willebrand (FvW).
O FvW é importante por apresentar
dois papéis básicos na hemostasia: primeiro, como uma ponte adesiva entre as plaquetas e a
parede do vaso lesado e segundo, como um carreador e estabilizador do Fator
VIII plasmático( 13 ). O pool plasmático do FvW é derivado 85% das células
endoteliais, enquanto que o pool plaquetário é sintetizado dentro do
megacariócitos( 12 ).
É caracterizada clinicamente por equimoses, hemartroses, sangramentos
de pele e mucosas e história de outros casos semelhantes na família. O tempo de
sangramento (Ivy) é alargado e o tempo
de tromboplastina parcial em alguns casos está alargado.. O tempo de
protrombina é normal e há diminuição ou ausência de agregação plaquetária induzida
pela ristocetina. Há diminuição dos níveis do fator von Willebrand .
Os níveis do FvW estão diminuídos na doença de von Willebrand
hereditária, adquirida e estão aumentados em processos neoplásicos e
inflamatórios (7,10).
O objetivo deste trabalho foi o de conhecer a casuística da doença de von Willebrand entre os
pacientes com coagulopatias.
Pacientes e Métodos:
Foram analisadas 106 amostras de plasma de pacientes encaminhados ao
Laboratório Lâmina entre o período de
março de 1999 e março de 2000, para fins de diagnóstico de coagulopatias.
Método de Dosagem do FvW:
O método empregado foi o
Liatest vWF da STAGO. A dosagem do fator em questão foi
feita através a medida da absorbância à
luz produzida por uma suspensão de partículas de microlátex coberta por
anticorpos específicos.
As limitações desta dosagem são devidas a amostras coaguladas e plasmas
lipêmicos que podem levar a uma diminuição da leitura ótica.
Os valores esperados do FvW por este método na população adulta é de 50 a
160%(4).O FvW aumenta durante a gravidez, com o uso de anticonceptivos orais,
exercícios físicos e stress (2), mas
sempre dentro da faixa da normalidade. As populações de grupo sangüíneo 0 tem
níveis plasmáticos mais baixos (1,2), também dentro da faixa mínima da normalidade.
O estudo estatístico foi feito por estudos da média, percentil e
análise da variância do software Excel.
Resultados:
A idade variou de 4 meses a 92
anos.
Das 106 amostras estudadas, 62 foram de mulheres. A idade média das
mulheres foi de 36 anos e de homens 34
anos.
Das 62 amostras de mulheres ,6
eram compatíveis com o diagnostico de DvW (9.6%)
Das 44 amostras de homens estudados, 2 eram compatíveis com o
diagnóstico de DvW (4.5%)
Das 106 amostras sem separar os
sexos , 7,5% eram compatíveis com o diagnóstico de DvW .
Discussão:
A doença de von Willebrand é na
verdade uma síndrome que quando grave é simples de se fazer o diagnóstico
laboratorial: há prolongamento do tempo
de sangramento, tempo de tromboplastina parcial ativado (PTTA) alargado e
níveis baixos de fator von Willebrand e às vezes redução do fator VIII.
A incidência da doença de von Willebrand é desconhecida, porém ela pode
ser tão alta como de 1 paciente em
500 pessoas estudadas (1). O maior
problema em se saber a incidência é que muitos portadores da doença são assintomáticos
e sem alterações laboratoriais. Outros apresentam-se com hemorragia de maneira
cíclica. (observações não publicadas)
Na nossa casuística os níveis de
FvW no sexo masculino não diferiu de maneira estatisticamente significativa do
sexo feminino . Também a média de idade dos pacientes segundo o sexo não variou.
Somente em um caso houve
também diminuição do fator VIII . A
doença de von Willebrand deve ser
diferenciada da hemofilia clássica e de alterações na função plaquetária. Na
hemofilia A, o nível de FvW está normal ou elevado, embora alguns casos de
doença de von Willebrand possam ser
acompanhadas de redução do FVIII. No passado usava-se a aspirina para se
identificar o prolongamento do tempo de sangramento em pacientes com DvW, que
seria muito mais acentuado. Atualmente este teste não é mais feito devido à
freqüência de alterações plaquetárias hereditárias que também levam a um
aumento do tempo de sangramento. A história de sangramento na DvW e nos
defeitos plaquetários é muito semelhante. A função plaquetária na DvW atualmente é estudada pela curva de agregação plaquetária que pode se mostrar alterada somente com o agonista ristocetina.
A DvW é classificada da seguinte
forma: Defeitos Quantitativos:
·
deficiência parcial de FvW (tipo 1)
·
deficiência severa (tipo 3)..
Defeitos qualitativos :(tipo 2) :
·
tipo 2A
:`variante com função plaquetária alterada associada à perda de múltimeros de
FvW de alto peso moleculoar.
·
tipo 2B variante com aumento de afinidade
plaquetária para a glicoproteína Ib.
·
tipo 2M variante com função plaquetária diminuída
sem estar associada à perda de multímeros de alto peso molecular .
·
tipo 2 N
variante com diminuição da afinidade ao FVIII.
Com a prática e experiência
dentro de um laboratório de coagulação, deixamos registrado que o melhor método para se detectar a DvW não é a curva de agregação
plaquetária com a ristocetina, mas a dosagem
do cofator ristocetina. Se houver clínica importante de DvW e o teste
estiver normal, este deve ser repetido algumas vezes ao ano pois a DvW
pode vir acompanhada de deficiências
transitórias do cofator ristocetina. Com este estudo seriado poderemos fazer o
diagnóstico das diversas variantes de
DvW
Na última década descobriu-se que alem de seu papel importante na hemostasia,
o FvW tem sido implicado na etiologia de
microangiopatias trombóticas. O FvW, é
uma glicoproteína de grandes multímeros, que pode ser encontrada no
plasma, plaquetas e nas células do endotélio vascular. É medianeiro da adesividade plaquetária nas
lesões endoteliais e, é carreadora do FVIII,
necessária para a sobrevida do mesmo na circulação.
Os multímeros gigantes são mais
ativos na interação, induzindo
diretamente a agregação
plaquetária. Estes multímeros gigantes anormais foram detectados na síndrome
hemolítica urêmica (2) e atualmente é considerado um marcador das microangiopatias trombóticas, pois na fase aguda dessas patologias encontram-se
ligados às plaquetas ativadas.
As proteases são enzimas que clivam o FvW fisiologicamente . Os níveis
das proteases são inversamente proporcionais aos níveis do FvW.Os pacientes com
Púrpura Trombocitopênica Trombótica (PTT), tem níveis baixos ou até mesmo
ausência de proteases no plasma. Nos pacientes com Síndrome Hemolítica Urêmica
(SHU) elas estão em níveis normais.(4,14). Furlan et al (4) e Tsai e
Lian,(14) descreveram que essas enzimas estão diminuídas também em formas secundárias de PTT (devido a HIV, uso
de ticlopidina e de clopidogrel). (2,9,16). Van der Plas et
al (18) , ao contrário de Furlan (4) descreveu que as proteases não estariam
diminuídas somente nas PTT, mas também na SHU principalmente naquelas
secundárias à sepse por E coli (17). Os níveis das proteases na
PTT pós transplante de medula óssea
(TMO) estão normais. Oleksowicz et al,(11) encontrou níveis muito
baixos de proteases em pacientes com neoplasias malignas metastáticas, na
ausência de PTT. Outros autores
encontraram níveis normais ou levemente diminuídos da enzima.(3)
Até o momento não se sabe exatamente porque os níveis da enzima estão
diminuídos em situações fisiológicas e/
ou patológicas. Sabe-se que os íons metálicos são necessários para sua completa
atividade (5,15), sendo por isso chamadas
de “metaloproteínas”.
No nosso grupo de pacientes encontramos dois do sexo masculino com
níveis de FvW acima de 160% : 1 de 65 anos, em que não foi possível conhecer
o histórico, com o nível de FvW de 375% e o outro paciente com 83 anos com
diabetes e insuficiência renal. Encontramos no nosso estudo pacientes com
neoplasia metastática com altos níveis
de FvW porém sem ultrapassar 160%
: 1) paciente com nível de FvW de 112%,do sexo masculino, com neoplasia
metastática, 2) paciente com nível de FvW de 149%, do sexo feminino, com
neoplasia metastática de ovário 3)paciente com nível de FvW de 112%,do sexo
masculino, com carcinoma prostático disseminado. Encontramos também dois casos
de aumento menor que 160%, em duas crianças normais (níveis de 139% e de 112% de FvW).
Os pacientes com uremia apresentam níveis reduzidos de proteases sem
relação com a creatinina sérica, tomada como índice de insuficiência
renal. Os pacientes submetidos a
cirurgia abdominal tem seus níveis de protease diminuídos no pós operatório. A
proteína parece sofrer influência de altos níveis de estrogênio, já que os
níveis plasmáticos caem progressivamente no primeiro trimestre de gravidez . Os
baixos níveis encontrados em recém natos a termo podem ser explicados como uma outra expressão
fenotípica de imaturidade do fígado do
recém nato, como indicado pela normalização dentro dos primeiros 6 meses de
nascido.
O correlato mais importante dos níveis de protease é o nível plasmático
do FvW .Sempre que os níveis de protease
caem os níveis de FvW se elevam. Esta correlação inversa entre a protease e seu
substrato, o FvW, pode ser explicada pelo consumo da protease como conseqüência
de um fenômeno compensatório levando à liberação de formas de FvW com maior
adesividade e agregabilidade plaquetária .
Os níveis plasmáticos do FvW são indicadores de aumento de risco de
trombose e aterosclerose
Das 106 amostras de pacientes estudadas, 2 apresentavam-se com o nível
de FvW acima do valor mais alto de referência, ou seja: 160%
Os níveis de FvW tendem a ficar
mais elevados em situações trombogênicas. Em um trabalho publicado recentemente
(16 ) foi demonstrado que as plaquetas são recrutadas para locais da árvore
arterial de maior stress em coelhos hipercolesterolemicos, locais esses ainda sem lesões ateroscleróticas Dessa forma
foi concluído que as plaquetas ativadas pelo FvW podem agravar ou perpetuar lesões
endoteliais. As plaquetas quando se aderem ao endotélio nos locais de
predileção para o desenvolvimento de placas ateroscleróticas atraem os monócitos para o espaço
subendotelial. Os fatores que acarretam maior interação entre as plaquetas e as
células endoteliais são principalmente mediados pelo FvW, glicoproteína Ib e
selectina P. Esses caminhos de adesividade podem, portanto, constituir alvos
terapêuticos para se prevenir prematuramente
o desenvolvimento de aterosclerose.
Conclusão:
Do trabalho por nós realizados e
da revisão da Literatura Médica sobre o assunto, concluímos que:
1- A prevalência de
Doença de von Willebrand é elevada, pois esteve presente em 7,5% dos pacientes
que foram referendados ao Laboratório
com coagulopatias a esclarecer.
2- A prevalência de
Doença de von Willebrand foi mais freqüente no grupo de mulheres (9,6%) em
comparação com o de homens (4,5%) provavelmente porque as mulheres menstruam e
sendo assim a natureza as dotou de maior oportunidade de mostrar clínica de sangramento do que os homens.
3- As neoplasias e a
uremia podem ser acompanhadas de aumento
do FvW, observado em 5 casos deste estudo.
4- A correlação de
níveis elevados de FvW com maior trombogenicidade é um fato incontestável, na literatura
médica.
Devido ao fato de muitos planos
de saúde não cobrirem a realização da dosagem do fator von Willebrand e os
altos custos do mesmo nos Laboratórios,
torna-se difícil para os médicos hematologistas
fazerem o diagnóstico da
doença e para os oncologistas, nefrologistas,
infectologistas, intensivistas e pediatras conhecerem os níveis do fator von
Willebrand em casos de neoplasias metastáticas, uremia, HIV, uso de clopidogrel
ou de ticlopidina e púrpura trombocitopênica trombótica Assim sendo torna-se necessário conscientizar a medicina
de grupo e os Laboratórios quanto à importância da realização do referido exame
para diagnóstico e controle de várias doenças.
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